Secretaria Municipal da Reparação – SEMUR
Secretário PROF. SANDRO CORREIA
A FORMAÇÃO DE UMA CIDADE CIDADÃ A PARTIR DA COMPREENSÃO DAS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS E SOCIAIS
Salvador, 2008
A FORMAÇÃO DE UMA CIDADE CIDADÃ A PARTIR DA COMPREENSÃO DAS QUESTÕES ÉTNICO-RACIAIS E SOCIAIS
Com o propósito de ser uma instância responsável por articular com as instituições governamentais e não-governamentais políticas públicas de promoção da igualdade racial, a Secretaria Municipal da Reparação (SEMUR) buscou marcar suas ações por meio do diálogo aberto com todas as entidades parceiras que comungam com o objetivo de minimizar as questões de desigualdades sofridas pelos afro-descendentes. Vale destacar que está população representa 83% soteropolitanos e não desfrutam das mesmas oportunidades e tratamentos dados a parcela não-negra, como comprova os indicadores sociais.
A nova gestão iniciou as atividades com muitas demandas, mais sempre preocupada em abrir um canal de diálogo permanente com a sociedade civil, possibilitando uma maior compreensão sobre as demandas urgentes e necessárias dos segmentos socialmente excluído da cidade de Salvador.
O titular da secretaria, Sandro Correia, nos primeiros dias de seu mandato, por exemplo, se atualizou sobre o processo de recuperação do terreiro Oyá Onipó Neto, no bairro do Imbui, a fim de acalmar os ânimos da comunidade negra, que pedia um posicionamento que demonstrasse que a Prefeitura de Salvador não era intolerante e que respeitava as religiões de matrizes africanas. E isso foi feito.
Mas não somente ajudar a prefeitura a resolver este impasse, que ganhou grande destaque na mídia local e criou desconforto entre a instância municipal e a militância negra, a SEMUR ampliou as parcerias e união de esforços com várias secretarias do Município e do Estado, exemplificado com o convênio com a Secretaria Municipal de Saúde para a criação do grupo de trabalho da saúde da população negra, uma vez que era uma reivindicação antiga desta parcela da população, que é vitimada, por exemplo, com a anemia falciforme, não tendo tratamento adequado; com a Emtursa, para um maior apoio aos blocos afros no Carnaval; com a Secretaria de Habitação, para ações de infra-estrutura em bairros negros e nos terreiros de Candomblé; com a Secretaria de Educação, para a implantação efetiva da Lei n.º 10.639.3, que regulamenta o ensino de história da África e da cultura afro-brasileira; com a Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente, para a preservação do Parque São Bartolomeu - patrimônio afro-brasileiro; com a Secretaria Estadual de Promoção da Igualdade (SEPROMI) fortalecendo e disseminando as atividades de promoção da igualdade racial e social.
Outra frente adotada pela SEMUR foi a promoção de eventos temáticos, a fim de possibilitar na cidade espaços para discussões e reflexão, dando visibilidade a população negra nos seus mais diversos aspectos sociais, culturais, econômicos, tradicionais e artísticos, contribuindo para reparar uma dívida histórica que o Estado brasileiro tem para com os afro-descendentes.
Desta proposta surgiu o seminário "Experiências da População Negra e os 120 anos da Abolição Inacabada". Durante o encontro, especialistas discutiram as condições de vida do povo negro após 120 anos de promulgação da Lei Áurea, que acabou com a escravidão legal no Brasil. Além disso, os participantes aprofundaram questões relacionadas à habitação e territórios, educação e trabalho, saúde e religião. Todos estes temas com o foco no cotidiano da população negra.
O seminário “O Espaço Urbano e os Templos de Religiosidade de Matriz Africana” serviu para esclarecer sobre o direito e os procedimentos para requerimento a isenção tributária e regulamentação fundiária dos terreiros de candomblé. Deste seminário surgiu a necessidade de se criar uma cartilha explicativa, orientando os líderes dos terreiros sobre o passo a passo para tais procedimentos.
Além dos eventos temáticos, a nova gestão sistematizou os projetos e programas já existentes na secretaria, fazendo algumas reformulações para ampliar seu alcance, sob o entendimento de que qualquer ação de reparação elaborada para Salvador deve ser desenvolvida por meio de ações concretas e de grande repercussão nas comunidades alvos. A idéia é fomentar as iniciativas para que, em alguns casos, as ações se multipliquem e ganhem relevo social, inclusive nacionalmente.
Inúmeros são os projetos que podem ser citados para alcançar este objetivo, a exemplo do Programa de Combate ao Racismo Institucional (PCRI), que tem como principal meta apoiar o setor público no combate e prevenção ao racismo institucionalizado, capacitando os gestores públicos para a promoção da igualdade racial.
O projeto contou com a parceria da SEPROMI, SPM, EMTURSA, PRODASAL, SESP, Ouvidoria Geral do Município – OGMS, Assessoria de Promoção da Equidade em Saúde, Ministério Público Estudual, Delegacia Regional do Trabalho, Aganju Afro-Escritório Jurídico, Polícia Militar e Instituto de Mídia Étnica.
Um exemplo que comprova a conquista deste diálogo aberto com as instituições privadas é o Projeto Selo da Diversidade Étnico Racial no Mercado de Trabalho, que tem como objetivo o reconhecimento das empresas, entidades sindicais e organizações da sociedade civil que investem na promoção da diversidade racial e de gênero dentro do mercado de trabalho. Sob a consultoria do professor Hélio Santos.
Tal ação faz parte do PCRI, coordenado pela SEMUR, em parceria com SEMPRE, SEDES, SMEC, SESP, SEPROMI e SPM, visando, além do combate ao racismo institucional, discutir a importância da dimensão racial.
Ainda na linha de inclusão social e racial foi criada a Feira de Incentivo ao Empreendedorismo Negro para divulgar e promover o trabalho, inicialmente, cerca de 60 empreendedores afro-descendentes, realizada em parceria com Associação de Cultura e Arte (CULTUARTE) e o SEBRAE. Pretende-se ampliar as parcerias para a realização de mais feiras, tornando-as um espaço regular para exposição dos produtos e geração de emprego e renda para os artesãos.
Não esquecendo seu papel de também atuar no acompanhamento das ações que afligem a comunidade negra, A SEMUR idealizou o Projeto Observatório da Discriminação Racial e de Violência Contra as Mulheres no Carnaval. O projeto atende e orienta pessoas vítimas de discriminação racial, além de dar visibilidade na mídia para os temas relacionados à participação da população negra no Carnaval, como: desfile dos blocos afros, blocos de samba, afoxés, reggae, Carnaval nos bairros e o trabalho informal de negros e negras. No ano de 2009 passará por algumas alterações que aumente a participação da sociedade civil.
No aumento da compreensão a respeito das religiões de matriz africana, foi iniciado o Mapeamento dos Terreiros de Candomblé, que apresentou informações referentes à condição de infra-estrutura, documentação e regularização fundiária, entre outros aspectos sócio-demográficos do povo-de-santo. No total, foram cadastrados 1.138 terreiros de Candomblé em toda a cidade, incluindo a Ilha de Maré.
Isso facilitou o direcionamento das ações, uma vez que também foram identificadas as carências e onde elas são mais graves. Este número não corresponde ao total de terreiros existentes na cidade de Salvador, uma vez que a Federação Nacional do Culto Afro estima a existência cerca de quatro mil terreiros. Por conta disso, emerge a necessidade da continuidade do mapeamento, que facilitará ainda mais as ações mais efetivas no que diz respeito à Regularização Fundiária dos Terreiros de Candomblé.
Quanto à preservação cultural, a SEMUR possui experiência com programa de preservação do patrimônio cultural e ambiental afro-brasileiro, participando do Projeto Memorial Pirajá, realizado em conjunto com a Câmara Técnica do Parque São Bartolomeu e formada por secretarias municipais e estaduais, juntamente com organizações da sociedade civil. Esta parceria mapeou os projetos dos órgãos já existentes na região do subúrbio correspondente a área da Bacia do Cobre, que deverá ser potencializado tão logo as obras de infra-estrutura estejam concluídas.
É importante destacar que todas as iniciativas nesta gestão são pautadas pelo entendimento que é preciso realizar ações afirmativas nos diversos segmentos da sociedade para a promoção de ações de reparação num diálogo permanente com a sociedade civil, instituições públicas e privadas, garantindo assim uma efetiva cidadania de direitos e deveres.
Uma das várias atuações de destaque desta nova gestão foi com a conquista da representatividade nos diversos eventos de cunho acadêmico que ocorreram da cidade de Salvador, pontuando o posicionamento da SEMUR e trazendo à luz a discussão das particularidades que precisam ser observadas pela sociedade civil quando se discute reparação e inclusão social.
Alguns dos eventos de grande relevância: o seminário "Milton Santos: o homem e sua obra", na mesa "O Olhar Geográfico Frente ao Desenvolvimento Urbano de Salvador: Pontos Frágeis do PDDU".
Em palestra, no Instituto de Geociências da UFBA em homenagem aos 30 anos de lançamento de um dos primeiros livros do geógrafo baiano (Por Uma Geografia Nova), o secretário-professor Sandro Correia abordou a importância e atualidade do pensamento do professor Milton Santos. Ele também participou da audiência pública sobre juventude negra sobre o tema "Em Defesa da Vida e da Liberdade da Juventude Negra". Na ocasião, o secretário juntamente com outros representantes do poder público e sociedade civil, discutiram a elaboração e implementação de estratégias e ações de enfretamento ao genocídio de jovens negros em Salvador, relacionados ao racismo e formas de opressão que são sustentadas por critérios raciais, de gênero e orientação sexual.
A SEMUR marcou também a sua participação em audiências públicas sobre as cotas, discutindo formas de subsídios para permanência dos cotistas nas universidades, juntamente com o Ministério Público Estadual (MPE-BA).
O secretário participou do 1º seminário sobre as perspectivas da geografia no século XXI. O evento promovido pelo Centro Acadêmico de Geografia da Universidade Federal da Bahia destacou a importância de se debater e qualificar um PDDU para Salvador que responda as reais necessidades da sua população.
AÇÕES PROPOSITIVAS: CONQUISTAS
A SEMUR estabeleceu parcerias com outras secretarias e órgãos municipais e de outras esferas do poder público para articular a inclusão do viés racial em todas as políticas públicas implantadas na cidade pela Prefeitura de Salvador, promovendo a igualdade racial e a oferta das mesmas oportunidades e tratamento para a população negra.
Neste sentido, foram viabilizadas, no curto período desta gestão, articulações simbólicas de relevância no campo da inclusão, dialogando com o poder legislativo, por meio do vereador Gilberto José, foram viabilizadas as seguintes conquistas: entrega do título de cidadã a Edialeda Salgado, médica e presidente nacional do movimento negro do PDT; construção do busto de Maria Felipa, colocada no terminal marítimo de Salvador; e a inserção do negro no desfile Dois de julho com a ala Maria Felipa.
Além disso, a SEMUR inaugurou a Estátua Zumbi dos Palmares em parceria com o Grêmio Comunitário e Carnavalesco a Mulherada. O evento aconteceu no dia 30 de maio, na Praça da Sé, e contou com a participação do prefeito João Henrique, além de outras autoridades do município. A estátua representa o poder de grandes líderes africanos, demonstra ainda austeridade, vigilância, sagacidade, um verdadeiro guardião do Povo Negro Brasileiro.
Outra ação foi o processo de formalização do Conselho Municipal das Comunidades Negras, composto por órgão colegiado, integrante da estrutura básica da secretaria da Reparação, sendo constituída por 20 representantes indicados por entidades representativas da sociedade civil, que fazem parte do CMCN: Câmara de Vereadores e as Secretarias Municipais de Educação e Cultura, de Emprego e Renda, de Saúde, de Serviços Públicos, de Desenvolvimento Social, de Habitação e a Secretaria de Governo.
A SEMUR procura também fomentar as Rodas de Diálogos com representantes de diversos segmentos representativos da sociedade, a fim de propor políticas públicas de valorização, reconhecimento e afirmação de identidade. Neste sentido, já foram realizados encontros com representantes da Associação das Baianas e está agendado um encontro com a Irmandade Rosário dos Pretos e a representante da Capoeira em Salvador.
Ações em fase de planejamento e implementação para ampliar o raio de alcance e efetivar o entendimento da secretaria que uma Cidade Cidadã só é possível a partir da compreensão das questões étnico-raciais e sociais, como por exemplo:
- A de combate ao racismo, resgate histórico e conscientização dos direitos dos afro-descendentes;
- Capacitação de jovens para o mercado de trabalho para a inserção de Jovens Afro-descendentes, sensibilizando o empresariado para absorção da mão-de-obra negra;
- Projeto de Apoio e Permanência de Estudantes Cotistas Nas Universidades com o acompanhamento sócio-educacional;
- Realização da IVª Feira do Afro – Empreendedor com maior aporte financeiro e visibilidade, com uma nova metodologia e conceito com muito mais parceiros do afro-empreendedorismo no Brasil.
- Desenvolvimento e aplicação do Selo da Diversidade, priorizando a parceria com grandes empresas;
- Continuação do desenvolvimento e implantação do PCRI nas demais secretarias que não implantaram o programa, visando atingir todos os órgãos e secretarias que compõe a administração municipal;
- A criação de uma publicação trimestral sobre o racismo e suas devidas formas de combate, inclusive do racismo velado, bem como as ações já implementadas de políticas públicas de reparação.
Diante da complexidade e amplitude do campo de ação da SEMUR, e também de sua importância, deve-se atentar a fatores relevantes que poderão dar a esta uma maior dinamicidade. A Secretaria de Reparação carece de um quadro funcional mais amplo e qualificado, para que possa empreender mais ações reparatórias: historiadores, antropólogos, sociólogos que viram acrescentar ao quadro funcional existente na elaboração de novas ações e projetos.
Para elaboração e implementação de novas ações de caráter dinâmico e permanente, a secretaria precisa também de mais recursos financeiros e materiais, para ser possível a atuação em mais localidades, diretamente com o seu público alvo, mantendo o alinhamento com o compromisso da Prefeitura de Salvador contra o racismo e de incentivo ao resgate da cidadania, da história, dos direitos e da auto-estima da sua população afro-descendente.